José Simeão Leal

Catálogo da Exposição Retrospectiva de Visconti na II Bienal do Museu de Arte Moderna de São Paulo - 1954

Advertência: Este texto contém diversos erros biográficos. 

PATINHOS NO LAGO - OST - 60,0 x 81,0 cm - 1897 - COLEÇÃO PARTICULAR
PATINHOS NO LAGO – 1897

Presos às fórmulas dos velhos mestres românticos e naturalistas, os artistas brasileiros não se tinham apercebido até a primeira década do Século XX de um dos mais fecundos movimentos renovadores da arte europeia: o Impressionismo. Pintores como Pedro Américo, Vítor Meireles e Almeida Júnior, de importância fundamental na história da nossa arte, mantiveram-se a êle, completamente, alheios. E é curioso notar que foi o francês Manet, em contato com a intensidade luminosa de nossa terra, quem marcou a passagem entre aquela escola e o naturalismo. E é, ainda, com Visconti, de origem italiana, que se inicia a arte moderna brasileira, rompendo com um academismo estéril no seu artificialismo, desprovido de sentido num país sem formação clássica e ávido de novas formas de expressão. Foi êle o primeiro impressionista que tivemos, abrindo para os nossos pintores um campo amplo de pesquisas e identificação com tôdas as correntes artísticas contemporâneas.

Elyseu D’Angelo Visconti nasceu em Salerno, Itália, no dia 30 de julho de 1867; filho de Gabriel D’Ange1o Visconti e de Christina Visconti, veio com a família para o Brasil no mesmo ano do seu nascimento. Em 1884 começou a freqüentar o Liceu de Artes e Ofícios, no Rio de Janeiro, passando depois a estudar na Imperial Academia de Belas-Artes, onde, em 1888, obteve a Medalha de Ouro, em pintura. Foram seus mestres Vítor Meireles, José Maria de Medeiros, Henrique Bernardelli e Rodolfo Amoedo.

Fêz parte do grupo de alunos que fundou o “Atelier Livre”, onde se estudava pintura a exemplo da Academia de Julian, de Paris. Orientavam êste curso, Rodolfo Amoedo, Zeferino da Costa e os irmãos Bernardelli. No Salão dos Independentes realizado no próprio Atelier, Visconli expôs com grande sucesso.

Em 1892, Elyseu Visconti conquistou o 1º Prêmio de Viagem dado pela nova Escola Nacional de Belas-Arles, nome que tomara a velha Imperial Academia com a implantação do regime republicano entre nós. No ano seguinte partiu para a Europa. Ao chegar em Paris, inscreveu-se no concurso de admissão à Escola de Belas-Artes, conseguindo a honrosa classificação do 7º lugar entre 456 candidatos, frequentando ainda a Escola de Artes Decorativas dirigida por Grasset. Em seguida foi a Madri onde copiou, no Museu do Prado, alguns quadros de Velasquez, como “Redenção de Breda”, “As meninas’, “Infante D. Carlos’ e “Mariana D’Áustria”, Rainha da Espanha.

EX-LIBRIS DA BIBLIOTECA NACIONAL - GUACHE/NANQUIM SOBRE PAPEL - 26,0 x 21,0 cm - 1903 - FUNDAÇÃO BIBLIOTECA NACIONAL - RIO DE JANEIRO - RJ
EX-LIBRIS DA BIBLIOTECA NACIONAL – 1903

Ao contato com as obras do renascimento, inicia-se uma nova fase em sua carreira: a evidente influência dos mestres pré-rafaelistas exerceu-se, principalmente, através de Botticelli, onde a graça e a poesia de suas figuras se traduzem pela linearidade do traço. “Recompensa de São Sebastião” (1898), “Gioventú” (1898) e “As Oréadas” (1899) são os principais trabalhos dessa época. As duas úllimas telas foram expostas e premiadas com medalha de prata na Exposição Internacional de Paris, em 1900.

Regressando ao Brasil, aqui realizou duas exposições, uma no Rio de Janeiro e outra em São Paulo; concorreu ao concurso de selos postais, sendo vencedor, foi também premiado na Exposição de Artes Decorativas aplicadas. E’ de sua autoria o “Ex-Libris” da Biblioteca Nacional.

Em 1905, vamos encontrá-lo, novamente, no Salão de Paris, com o retrato da escultora Nicolina Vaz de Assis, que é, possivelmente, um de seus trabalhos mais representativos. E’ nesse mesmo ano que o Prefeito do Distrito Federal, Engenheiro Francisco Pereira Passos, o convida a executar as decorações para o Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Visconti dá início às obras em 1906, no Atelier de Puvis de Chavannes, em Paris.

Nesta fase, terão início as experiências pré-impressionistas: os estudos para o Teatro Municipal conduzirão o artista a pesquisas dentro das diversas técnicas em voga, decidindo-se êle pelo Impressionismo, processo que pela dissociação dos tons permitirá atingir a desejada leveza do conjunto. E o espírito sempre inovador de Visconti levou-o a juntar ao Impressionismo a fatura linear “botticelliana” para a execução daquela obra.

Não se limita Visconti, apenas, a êsse trabalho. Ao mesmo tempo vai realizando as decorações encomendadas, desenvolve grande atividade pintando várias telas entre as quais “Maternidade”, retratos, estudos e paisagens, notadamente as do “Jardim de Luxemburgo”. Nesses estudos observa-se a preocupação do artista em identificar-se com a técnica pré-impressionista.

Antes de voltar ao Brasil, expôs, em Paris, as decorações que se destinavam ao Teatro Municipal, sendo, ao chegar, nomeado professor da Escola Nacional de Belas-Artes.

MINHA FAMÍLIA (A ROSA) - OST - 100 x 78 cm - 1909 - COLEÇÃO PARTICULAR
MINHA FAMÍLIA (A ROSA) – 1909

No Brasil, o pintor lança-se a novas técnicas. Os primeiros trabalhos aqui realizados revelam uma influência “Pontilhista”, como por exemplo, “A Rosa” (1909). Pouco a pouco as côres vivas de nossa terra vão-se impondo à sua sensibilidade. Sua arte vai aos poucos se impregnando de atmosfera brasileira. Dessa época, contam-se muitos de seus melhores retratos e paisagens.

Na Exposição de São Luís nos Estados Unidos, em 1909, sua tela “Recompensa de São Sebastião” foi premiada com medalha de Prata e adquirida pelo Chile para o Museu de Santiago.

Quando se demite do cargo de professor, em 1913, para retornar à França, a fim de fazer a decoração do “foyer” do Teatro Municipal, é no impressionismo que irá obter a unidade necessária à obra anteriormente iniciada.

Terminada a primeira guerra mundial, Elyseu Visconti volta ao Brasil, continuando a trabalhar incansàvelmente. Em 1922, na Exposição Comemorativa do Primeiro Centenário de nossa Independência, conquista a “Medalha de Honra”, com o tríptico “Lar”.

São, ainda, obras suas dêsse período a decoração do vestíbulo do Conselho Municipal do Distrito Federal, e o grande painel representando a “Assinatura da Primeira Constituição Republicana” no qual figuram, em tamanho natural, 63 retratos de constituintes.

Após mais alguns anos de grande atividade, veio a falecer no dia 15 de oulubro de 1944, no Rio de Janeiro.

A obra de Elyseu Visconti, abrangendo 56 anos de intenso e perseverante trabalho, caracteriza-se por um sentido de pesquisas múltiplas e de realizações de grande valor pictórico, que o colocam entre os maiores artistas brasileiros.